Numa empresa que tem origem no café e, portanto, na terra, fazia sentido que houvesse, no dia a dia, uma maior ligação à natureza. São poucos os colaboradores do Grupo Nabeiro Delta Cafés, num universo de 3900 trabalhadores, que contactam com este lado mais orgânico e, por isso, fazia falta criar espaço e pretexto para novos e melhores hábitos. O convite é geral, mas o desafio não é para todos (e tudo bem): é mesmo para quem tem dentro de si esta sementinha de querer plantar, cuidar e colher algo novo. Mas quem sabe se ela não se multiplica?
A ideia surgiu ainda em 2021, no âmbito de um projeto do Grupo Nabeiro que promovia a saúde e o bem-estar dos seus trabalhadores, com uma série de pequenas iniciativas que decorriam pontualmente ao longo do ano. Mas esta em particular, a SOPA, tinha uma dimensão maior. “A criação de uma horta é um motivo para falarmos de muitos outros temas, como a alimentação, a saúde e a ligação com a natureza”, explica Lara Domingues, da equipa de Comunicação Interna da Delta Cafés.
A agência de comunicação True, parceira da Noocity, apresentou à Delta a proposta de programa e ficou responsável por desenvolver toda a imagem do projeto SOPA.
O arranque do programa, que terá a duração de um ano, teve direito a inauguração com pompa e circunstância. O encontro foi marcado para maio de 2022 nos armazéns do Grupo, em Marvila, Lisboa. Estiveram presentes as pessoas que deram forma à iniciativa, alguns convidados especiais e ainda cerca de 40 colaboradores da Delta. Neste primeiro programa piloto estão abrangidos cerca de 800 elementos das equipas de Lisboa, o que leva Lara, a responsável pelo projeto, a crer que “há interesse por este tema” e que “em breve haverá mais adesão”.
No dia do lançamento esteve também presente Rita Nabeiro, que foi a primeira a contar a sua experiência pessoal no que toca à ligação com a natureza. “Estar em Campo Maior aproximou-me da terra. Na cidade, esquecemo-nos de que o clima tem um impacto direto no que colhemos. Esta sensibilidade ganha-se, e por isso espero que quem está aqui presente hoje possa multiplicar esta semente por outros.” A seguir, Pedro Rocha, agricultor de profissão e grower na Noocity, pegou no microfone e levou o discurso mais longe: “O cultivo mudou a minha vida.”
Pedro Rocha, grower da Noocity
Com o lema “Grow your own food” (cultiva a tua própria comida) estampado na t-shirt, Pedro falou sobre o seu percurso, que foi “do tradicional” até à Noocity. Formado em Ciências do Ambiente, foi só depois do fazer 30 anos que Pedro decidiu tornar-se agricultor e viver de acordo com os seus ideais. “Temos a ideia de que vai aparecer uma solução milagrosa pensada por uma organização muito grande, mas não”, explicou. “A mudança tem de partir de todos, por mais pequenos que sejamos.” E foi nesse sentido que deixou o desafio a todos os presentes de se juntarem a esta iniciativa e, mais ainda, a levarem para as suas vidas, as suas casas e os seus círculos mais chegados. “A melhor solução é a que está ao nosso alcance. Hoje começamos a cultivar aqui mais do que comida”, disse ainda, antes de apresentar a Noocity.
Nascida em 2013, a Noocity é uma startup dedicada a facilitar a agricultura dentro das cidades, com pequenas hortas urbanas que transformam espaços mortos em espaços verdes e cheios de vida. Os seus canteiros inteligentes, com 27 centímetros de altura de solo e um sistema de irrigação inteligente, permitem poupar água e tornar a horta quase autossuficiente, ao ponto de apenas ser preciso regá-la de duas em duas semanas, mesmo no calor do verão. O truque está por baixo do substrato, num reservatório de água inferior, de onde ela sobe através de um tubo. Assim se dá à terra a quantidade adequada de água a cada momento. Mas a facilidade em manter a horta não significa que ela não precise de cuidados – e ainda bem que assim é. “O contacto com a natureza tem muitos benefícios para o bem-estar de cada um e também para o retorno às relações laborais, que foram interrompidas com a pandemia, e que são tão importantes para o sentido de comunidade”, salientou Lara Domingues. É por isso que a Noocity é cada vez mais procurada por empresas e outras instituições – exemplos disso, em Portugal, são a Farfetch ou a Microsoft e, em Paris, a sede da UNESCO.
No primeiro dia na horta plantaram-se tomateiros, couves e aromáticas com a ajuda do grower Pedro Rocha, que explicou que começar o processo com pequenas plantas é sempre mais fácil do que com sementes.
A primeira horta comunitária da Delta Cafés, instalada em Marvila, está entregue aos colaboradores da empresa, mas conta com um acompanhamento especializado de um grower da Noocity. Uma vez por mês, Pedro Rocha vem visitar o espaço, dar apoio à horta, colher e semear novas espécies, mas também falar com os novos agricultores sobre as suas experiências e descobertas com o programa SOPA, no sentido de os guiar e lhes passar novos conhecimentos. Ao longo dos próximos 12 meses, Pedro vai explicar-lhes como semear e plantar, quais as vantagens do solo e do substrato ou, por exemplo, como cuidar da rega. Entre visitas, volta e meia vai haver uma masterclass com convidados externos ao projeto, que vêm contar as suas experiências pessoais – do desperdício zero à sazonalidade na cozinha, dos probióticos naturais à naturopatia na horta, passando pela relevância da inovação social ou da economia circular. Mas como Pedro fez questão de relembrar durante toda a manhã aos presentes: “A horta é vossa. Os growers acompanham-vos, sabem que têm este conhecimento à vossa disposição, mas são vocês quem cuida deste espaço.” E deixou ainda um apelo: “Conquistem os vossos colegas até a Delta dizer: ‘Temos que fazer crescer este projeto’.”