Rui Nabeiro criou a Delta para ser independente. “Foi sonhada por mim. Mas, mesmo depois de estar criada, era difícil entrar no mercado. A concorrência do Norte e do Sul tinha os clientes controlados. Comecei a fazer esse trabalho, fazia uns cafés baratos e misturas. E comecei a fazer autovenda, vendia café à porta dos clientes. Foram anos de sofrimento.” Que acabaram por compensar. O negócio começou a correr melhor e as décadas de 1970 e 80 já foram de expansão. Em 1984, Rui Nabeiro inaugura a Novadelta – então a maior fábrica de torrefação da Península Ibérica – e em 1994, 33 anos depois da fundação, a Delta torna-se líder de mercado em Portugal. 

A Delta já tinha iniciado a rota para a internacionalização em 1986 – ano em que fundou um departamento em Badajoz e entrou no mercado espanhol – e a intenção foi reafirmada em 1998, com a chegada a Angola. Porém, é no novo milénio que Rui Nabeiro reforça a aposta com uma série de novos destinos. 

Em 2012, a Delta passa a estar presente de forma direta no Brasil. Através da Delta Foods Brasil, sediada em São Paulo, o Grupo Nabeiro entra no país que, com mais de 200 milhões de habitantes, se torna o seu maior mercado até então. O recorde é, no entanto, esmagado dois anos mais tarde, com a entrada na China.

Rui Nabeiro foi o verdadeiro self made man português, que a partir de um grão de café construiu um império internacional e uma das maiores fortunas do país, avaliada em mais de 400 milhões de euros. “É uma herança ao serviço da comunidade”, chegou a dizer. Nos últimos anos, nas várias entrevistas que deu, as palavras de Rui Nabeiro – ou o “senhor Rui”, como era tratado por todos – denotavam a naturalidade com que encarava o fim.

“Para mim, o fim nunca é fim. É fim para quem vai andando, mas é princípio para quem começa. Eu tenho ambição para mais, mas o tempo não me permite e tenho de ter consciência disso. Nos últimos três anos, sonho fazer, mas deixo fazer. É esse o caminho de quem quer ficar em saudade na família. O trabalho, neste momento, já não é meu; a minha ambição deve empurrar, mas não deve liderar. Devo deixar que os outros sejam líderes.”

A sucessão já tinha sido preparada há muito. É o neto Rui Miguel Nabeiro, o cérebro por trás do lançamento das cápsulas Delta Q, que assegura a presidência executiva do grupo. E o apelido deverá perdurar na gestão por muitos anos. Um protocolo familiar assinado por Rui Nabeiro, os seus filhos – João Manuel e Helena – e os seus quatro netos – Ivan, Marcos, Rita e Rui Miguel – garantirá isso mesmo. “Tal como garante que, caso algum membro da família queira vender a sua quota-parte da empresa, os restantes membros terão direito de preferência. Há ainda um Conselho de Família que se reúne uma vez por ano para tratar da estratégia do grupo. Cada um dos filhos tem 16% do capital e os quatro netos 8%. O restante capital estava nas mãos de Rui Nabeiro, mas será agora disperso pelos herdeiros”, escreveu o Expresso em 2022.

Hoje, mais de 60 anos depois da fundação da empresa, Delta é sinónimo de Campo Maior e Campo Maior de Delta. Não é por acaso que a vila tem uma taxa de natalidade acima da média nacional e uma taxa de desemprego abaixo da média do Alentejo. É por causa da Delta, que emprega uma larga percentagem de campomaiorenses. Foi essa a grande riqueza que Rui Nabeiro criou, como disse uma vez. Isso e a gratidão das pessoas. “Não preciso de mais.”