O mundo não ficou propriamente de pernas para o ar, mas a forma como olhamos para o café nunca mais vai ser igual. A nova máquina criada pela Delta revoluciona um dos mais banais gestos do quotidiano. O café deixa de cair para a chávena a partir da máquina e passa a subir da máquina para a chávena. Parece mentira? Parece. Mas podem acreditar.

“Isto tudo começou com a ideia de criar uma nova experiência sensorial ligada ao consumo do café”, explica Cláudia Figueira, Head of Innovation da Diverge, o Centro de Inovação do Grupo Nabeiro. Afinal, a experiência de tomar café no fim da refeição num restaurante Michelin não é assim tão diferente de o fazer num café do bairro. Quer num cenário quer noutro, é pouco provável que o momento perdure na memória. E assim, o que representava uma experiência relativamente indiferente para o consumidor transformou-se num desafio para a equipa de desenvolvimento de produto da Diverge. Desejosos de mudar o paradigma, viraram atenções para o sistema tradicional de extração do café – e tiraram as devidas ilações.

A primeira é que o café entra sempre na chávena de forma gravitacional, ou seja, de cima para baixo. A segunda, que as máquinas de cápsulas pouco ou nada mudaram desde a sua génese, nos anos 70. A pergunta impôs-se de rompante: “E se tentássemos introduzir o café de outra forma?”

A resposta acabaria por lhes entrar de forma inesperada pela porta do escritório que ocupam no Parque das Nações, em Lisboa. “Veio um engenheiro novo para a equipa, que embora desconhecesse este dossiê, me perguntou, passado um tempo, o que achava de tentarmos os dois montar um sistema de café que funcionasse por baixo da chávena e não por cima, como era habitual”, recorda o responsável da equipa de engenharia, João Branco.

A máquina RISE Delta Q with Starck contou sete anos em desenvolvimento e 21 pedidos de patentes.

O novo engenheiro nem sequer vinha da área alimentar – construir motores de barco era a sua especialidade –, mas ainda assim, sem dizer nada a ninguém, tinha começado a desenvolver sozinho essa ideia na “garagem” da Diverge – um pequeno espaço isolado dentro do Centro de Inovação, com uma bancada de trabalho e ferramentas.

Quando pensou que a ideia poderia ter pernas para andar, decidiu expô-la à sua chefia, que não hesitou em explorar esse caminho. Depois de algumas semanas a trabalharem na maturação do conceito, mostraram o que tinham em mãos. “O projeto ficou entre nós”, diz Cláudia Figueira, “e passados três meses apresentámo-lo a Rui Miguel Nabeiro”. A resposta do CEO do Grupo Nabeiro não poderia ter sido mais entusiástica. A  partir desse momento, o pequeno projeto ganhou relevância e toda a equipa foi envolvida.

Passados dois anos, o sistema RISE teve a apresentação mundial na Web Summit de 2017. Em vez de se levar um protótipo, construiu-se uma máquina enorme que ocupava o stand da Delta quase por inteiro, como uma instalação artística. A ideia de despertar a atenção dos visitantes foi bem sucedida, mas o que importava era observar as reações ao café que entrava pela base do copo. “Foi o primeiro ponto de validação. Eram filas e filas. Toda a gente queria experimentar. Foi aí que tivemos a confirmação de que o conceito de ativar todos os sentidos estava validado.”

E repararam que havia algo de especial no café que era extraído de baixo para cima. “Quando começámos a desenvolver o projeto, mal tirámos o primeiro expresso a nossa engenheira química disse logo ‘Calma, este café é diferente. Vejo-o a olho nu, por isso vamos analisá-lo’”, recorda Cláudia sobre a descoberta de que o novo modo de extração beneficia até o próprio sabor. 

“Com esta modificação extraímos o café diretamente para a chávena, o que significa que as propriedades aromáticas que tradicionalmente se perdem entre o momento em que o café sai da máquina e cai na chávena, aqui, devido ao novo sistema de extração, elas são enaltecidas, reforça a Product Development Manager, Paula Castelo. E isto é algo que a equipa só descobriu depois.

“Fomos à procura de um resultado e encontrámos outros inesperados, o que comprova que se trata de uma verdadeira inovação.”

Em suma, o expresso RISE tem mais textura, cremosidade, aroma e sabor. Já os estudos de neurociência demonstram que os olhos, de facto, não só comem como também bebem: “Houve pessoas que só de verem o café brotar de baixo para cima diziam logo, sem o terem provado, que era muito melhor.”

Depois deste primeiro momento de apresentação do sistema ao público, e de o mesmo ter sido aplicado noutros eventos, não faltaram oportunidades para recolher insights e inputs. O processo de desenvolvimento foi longo, tal como foi longo o processo de submissão de patentes. Todo o ecossistema RISE – o sistema de extração, a máquina e principalmente os copos – tem já 21 pedidos, quatro dos quais concedidos. “Estamos perante um produto disruptivo e inovador”, asseguram. Não foi apenas inverter o que existia, mas criar algo completamente novo, como explica João Branco: “Tivemos de reformular tudo o que é o sistema hidráulico normal de uma máquina de café. Tudo isto foi desenvolvido por nós.”

Compreendendo que é em casa das pessoas que o sistema RISE poderia brilhar com mais intensidade, passou-se à fase seguinte: miniaturizar tudo de modo a transformá-lo numa máquina doméstica, um eletrodoméstico. Esse ciclo de desenvolvimento ocupou os últimos quatro anos e envolveu , a convite de Rui Miguel Nabeiro, a curadoria e design do francês Philippe Starck, um dos designers e arquitetos mais conceituados do mundo. É dele a visão por trás da RISE Delta Q with Starck, cujos esquissos desenhou à mão em papel vegetal – não só a forma da máquina, como também os copos. O resultado está à vista: uma máquina inovadora que é fruto da proatividade dos engenheiros da Diverge, com linhas cuidadas e que tira um café expresso perfeito, mas ao contrário – de baixo para cima.