1. Um coração chamado Delta

Tudo começou com um coração de vidro. Pequeno no tamanho, mas enorme no significado. A 28 de março de 2002, um grupo de colaboradores da Delta decidiu surpreender Rui Nabeiro no seu 71.º aniversário com um presente especial: um coração vermelho, feito em vidro, que simbolizava a vontade de transformar pequenas ações de voluntariado num verdadeiro projeto de solidariedade. Foi assim que nasceu o projeto Um Coração Chamado Delta – um primeiro ensaio do que haveria de ser a Associação Coração Delta.

O plano era simples: recolher roupa, material escolar e outros bens essenciais, organizar tudo, depois do expediente, e, aos fins de semana, entregar a quem mais precisava. Os comerciais da Delta, que percorriam o país de norte a sul, deram uma ajuda preciosa, levando e trazendo doações. Em pouco tempo, o grupo cresceu e a ideia ganhou dimensão.

Três anos depois, a 31 de janeiro de 2005, o que começou como uma iniciativa voluntária oficializou-se com a criação da associação Coração Delta. Com quatro grandes áreas de atuação – educação, saúde, solidariedade e inovação social – a missão passou a ser maior e o impacto mais profundo. Dois anos mais tarde, em 2007, nasceu o Centro Educativo Alice Nabeiro (CEAN), um espaço que revolucionou a educação em Campo Maior e além-fronteiras.

Aquele primeiro coração de vidro ainda existe. Está num gabinete do CEAN, como um lembrete de que as grandes mudanças começam, muitas vezes, com pequenos gestos. E, passados 20 anos, o Coração Delta continua a bater forte.

2. Ensinamentos para a vida

Desde a primeira hora, a coordenação do Coração Delta, enquanto associação, foi assumida por Dionísia Gomes, que, com duas décadas de experiência na área social, viu neste projeto um desafio completamente diferente. “Foi uma volta de 180 graus na minha vida. Troquei um contexto muito tradicional pela construção de algo inovador”, recorda. Rui Nabeiro, por outro lado, acumulava experiência profissional em muitas áreas, mas não na área social – ainda não. “Pensei que ele teria muito que aprender naqueles primeiros tempos. Mas enganei-me.” O empresário e empreendedor revelou-se sábio, intuitivo e ponderado. “Liderava pelo exemplo. E tinha sempre uma resposta positiva para todos os que o abordavam”, recorda Dionísia, que trabalhou 17 anos ao seu lado. “O senhor Rui tinha uma sabedoria que não era apenas adquirida profissionalmente: vinha da sua história de vida e da sua personalidade. Isso ensinou-me mais do que consigo explicar por palavras.”

3. Escola também é casa

Nenhum aluno é igual a outro – e a escola deve ter margem para integrar todos. É esse o propósito da EPIS – Empresários Pela Inclusão Social, iniciativa que apoia jovens no seu percurso escolar, ajudando-os a ultrapassar dificuldades emocionais e académicas. Através de acompanhamento personalizado, o programa trabalha competências como a gestão emocional, a motivação e a melhoria do desempenho escolar.

Patrícia Poejo, hoje com 23 anos e animadora cultural nos museus de Campo Maior, integrou a EPIS no 7.º ano da Escola Secundária de Campo Maior. “A psicóloga Mafalda Minas ajudou-me a controlar melhor as minhas emoções. Tinha o meu pai doente, na altura, e foi difícil lidar com tudo. As minhas notas baixaram e ela ajudou-me a recuperar”, conta.

O impacto foi ainda maior no 9.º ano, quando perdeu o pai. “Foi um período muito difícil e a Mafalda esteve sempre lá. Ensinou-me técnicas de respiração, ajudou-me a gerir a ansiedade e a sair daquele lugar sombrio”, recorda Patrícia. O acompanhamento incluía sessões individuais, jogos de memória e dinâmicas estratégicas para melhorar o humor e a concentração. “Quando aquele apoio chegou ao fim, senti muitas saudades. Foi uma experiência muito importante para mim.”

 

4. Ter ideias para mudar o mundo

Imaginemos que se descobria a roda, mas não se contava a ninguém. Não faria sentido, certo? Foi nesse contexto que o CEAN lançou o manual Ter Ideias para Mudar o Mundo, que nasceu da vontade de partilhar com o mundo os resultados da sua prática e de levar o empreendedorismo a outras escolas de forma inovadora.

Um dos grandes impulsionadores deste projeto foi o professor Nuno Brito, na altura vice-presidente do Instituto Politécnico de Viana do Castelo. “Havia um concurso para fomentar o empreendedorismo nos politécnicos”, recorda. “Mas rapidamente percebemos que era preciso um método mais global”. Brito decidiu então percorrer os 400 quilómetros até Campo Maior – onde a metodologia da Escola Cultural (que promove uma formação transversal, dinâmica e empírica) já estimulava o pensamento crítico e criativo das crianças – e lançar o convite para a produção deste livro.

A metodologia inovadora foi sintetizada neste manual criado com o objetivo de permitir a replicação do modelo, incluindo a formação de formadores. Chegar aos professores significava chegar às crianças, mas também aos pais e às comunidades. Sistematizada em 93 páginas, a metodologia serviu de base para formações e encontros promovidos pelo professor. O manual Ter Ideias para Mudar o Mundo foi implementado durante cinco anos letivos consecutivos em todas as escolas da região do Alto Minho, alcançando crianças dos três aos 12 anos.

Os resultados foram – e são – imensuráveis. “O valor da capacitação é impossível de quantificar. Mas a verdade é que desenvolvemos a capacidade empreendedora das crianças, não apenas num sentido empresarial, mas também social e pessoal. O que nos contaram os professores foi que a curiosidade para o empreendedorismo aumentou exponencialmente e que as crianças foram verdadeiramente capacitadas. O desafio foi conseguido.”

5. Alice Nabeiro a dobrar

De 2007 em diante, Alice Nabeiro deixou de ser exclusivamente o nome da matriarca da família Nabeiro, esposa de Rui Nabeiro, para passar também a ser o nome do novo centro educativo – uma das maiores apostas do Coração Delta na área da educação.

O dia em que o Centro Educativo Alice Nabeiro (CEAN) abriu portas ficou na memória de todos. Por vários motivos, mas um em particular: a surpresa associada à escolha do nome. O evento aconteceu justamente no dia em que Rui Nabeiro completava 76 anos, a 28 de março. “A inauguração foi especial”, recorda Helena Nabeiro, vogal da direção do Coração Delta e filha da dona Alice. “A minha mãe não sabia que o espaço ia ter o nome dela, foi uma surpresa. Julgava que aquela azáfama toda tinha que ver com o meu pai, por causa do aniversário. O mais habitual era ser tudo sobre o senhor Rui, e por isso deixámos que ela ficasse com essa ideia, enquanto preparávamos a surpresa.”

Só quando a fachada foi destapada é que Alice Nabeiro descobriu a surpresa. “A minha mãe não esperava. Ficou encantada. Mas fazia todo o sentido, porque ela está aqui desde o primeiro minuto”, garante Helena Nabeiro, que diz ainda ter sido a mãe a escolher os materiais e a acompanhar as obras. João Manuel Nabeiro acrescenta: “A necessidade de criar um espaço onde o processo educativo surgisse logo nos primeiros anos de vida das crianças era tanto do meu pai quanto da minha mãe, talvez até mais da minha mãe, e está espelhada no centro educativo desde o início.”

Ao longo destes 17 anos, a dona Alice tem sido presença assídua no CEAN. “Vinha passar a tarde e dar apoio. Os miúdos conheciam-na bem e ela adorava estar com eles, fazer brincadeiras, dar-lhes mimo”, recorda Helena Nabeiro. “Basta falar nas crianças para lhe brilharem os olhos.”

6. Será que o limite é o céu?

Como é que um campomaiorense de apenas nove anos de idade dá por si a falar para uma plateia com centenas de pessoas sobre a origem do Big Bang? A resposta está ligada ao Coração Delta e, em particular, ao Centro Educativo Alice Nabeiro.

Rodrigo Raimundo sempre teve fascínio pelo desconhecido. A ciência era a sua grande paixão, e o CEAN ajudou, a alimentar essa curiosidade. Entre os cinco e os 12 anos, Rodrigo frequentou o ATL do centro, onde foi tendo acesso a projetos, materiais e experiências novas. “Abriram-nos os horizontes, porque a vila é pequena comparada com o resto do mundo”, explica Rodrigo. Quando estava no quarto ano, foi convidado a apresentar a sua própria teoria sobre a origem do Big Bang no TEDx Kids – no Museu da Eletricidade, em Lisboa – onde foi o orador mais jovem. Dois anos depois, atravessou a fronteira para entrar numa competição de robótica.

Durante três dias, em Badajoz, competiu com um robô programado em equipa, no CEAN, criado para fazer um percurso o mais depressa possível. O grupo conseguiu o melhor tempo e venceu o primeiro prémio: 150 euros. Em vez de ficarem com esse valor, entregaram-no a Rui Nabeiro, pedindo que fosse doado a uma instituição de solidariedade social da região. Agora com 19 anos, Rodrigo estuda Engenharia Física e continua interessado em explorar o desconhecido. Foi, no entanto, no CEAN que aprendeu uma das lições mais importantes: a curiosidade leva-nos longe, mas mais além quando acompanhada pelo sentido de comunidade.

7. Quanto mais cedo, melhor

“O meu coração de mãe dizia-me que havia algo diferente”, recorda Patrícia Santos. Lourenço tinha dois anos quando a mãe percebeu que algo no seu desenvolvimento não estava a evoluir como esperado. Foi então que Lourenço começou a ser acompanhado pela Intervenção Precoce do Coração Delta. O serviço destina-se a crianças até aos seis anos que tenham dificuldades no desenvolvimento, garantindo um acompanhamento próximo e personalizado em Campo Maior, Monforte e Arronches. O trabalho da equipa especializada, em colaboração com as famílias, faz toda a diferença no crescimento das crianças. “Sinto que, enquanto mãe, faço parte desta equipa multidisciplinar”, diz Patrícia.

Em quatro anos, Lourenço recuperou o atraso de ano e meio no seu desenvolvimento. O menino que “não comunicava nem mantinha contacto visual” passou a ser uma criança curiosa, afetuosa e comunicativa. “Graças à Ester, à Célia e à Marina”, sublinha a mãe. “Sinto um agradecimento profundo. Jamais poderei contar a história do Lourenço sem mencionar os nomes delas.”

8. Tempo para Dar

Campo Maior, como vila do Alentejo interior e fronteiriça que é, debate-se com o envelhecimento e o isolamento da população. Em 2010, depois de uma série de notícias que relatavam casos de solidão entre idosos, Rui Nabeiro criou uma iniciativa que pudesse fazer a diferença. “Foi nessa altura que eu e a Dionísia [Gomes] apresentámos o projeto ao senhor Rui que, muito sensibilizado por estes temas, nos apoiou de imediato”, recorda Cláudia Gama, coordenadora do Tempo para Dar.

O projeto arrancou em 2010 com voluntários recrutados dentro do Grupo Nabeiro em visitas aos vários departamentos. “Criou-se uma rede de pessoas que visitavam os idosos, lhes faziam companhia e davam algum apoio”, recorda Cláudia. O projeto foi crescendo, e também o tipo de apoio: além do acompanhamento ao domicílio, passou a haver iniciativas internas, como a oficina de costura, o reviver de cantares regionais e ainda a oficina da flor, onde flores de papel – inspiradas nas das Festas do Povo de Campo Maior – são feitas à mão.

No evento de celebração dos 20 anos do Coração Delta, as senhoras que frequentam a oficina ofereceram a Marcelo Rebelo de Sousa um quadro feito por elas, com botões de rosa em papel, simbolizando a dedicação e o impacto do Tempo para Dar.

9. Oficina da Flor

“É a minha segunda casa”, resume Isabel Estríbio, de 78 anos, referindo–se ao Tempo para Dar. Criado para combater a solidão dos idosos, o projeto oferece companhia, atividades e a oportunidade de aprender algo novo todos os dias. Isabel trabalhou a vida toda. Depois de criar os seus dez irmãos, esteve 30 anos na Novadelta e, mais tarde, trabalhou para cima de uma década na casa de Rui e Alice Nabeiro. “Ajudei a criar os gaiatos da família”, diz com ternura. Já com 70 anos, reformou-se de vez, mas tinha demasiada vida para se deixar ficar em casa. “Quando me quis juntar à Oficina da Flor, do Tempo para Dar, tive sorte: no próprio dia fiquei lá”, conta. Fez daquele espaço uma segunda casa e daquela equipa, composta por 20 idosas, uma segunda família.

As atividades diárias do grupo são guiadas por duas monitoras, Tânia e Maria João. “São princesas, cuidam de todas nós por igual, são pessoas especiais”, garante. Nesses sete anos, Isabel tem-se dedicado a bordar e a fazer flores de papel. “Eu não sabia fazer uma única flor nem um torcido, não sabia sequer bordar. Não tive vida para isso: só tinha tempo de trabalhar, mais nada. Mas agora que aprendi, sei fazer e gosto muito.” Entre conversas, agulhas e pétalas de papel, os dias passam-se com alegria. “Parar é morrer”, afirma com determinação. “Olhe que estou mais nova e tudo!”

10. Coração Delta Academia de Ténis

No nome deste projeto, “Coração Delta” vem antes de “Academia de Ténis”. Não é por acaso. “É por causa de Rui Nabeiro, que dizia sempre que o coração vem primeiro”, explica Sancho Moura, o professor de matemática e ciências no CEAN e aficionado de ténis. Foi ele o responsável por apresentar esta ideia ao Comendador e lhe dar forma, em 2017. “O senhor Rui adorou logo a ideia”, recorda.

O arranque da academia teve dois ingredientes essenciais: o apoio da Junta de Freguesia Nossa Senhora da Expetação, que disponibilizou os campos, e o entusiasmo dos alunos do CEAN. Oito anos depois, conta com cerca de 40 atletas entre os 10 e 18 anos, 50 crianças do pré-escolar e ainda alguns adultos. “Juntamos muita gente em torno desta modalidade”, resume Sancho.

Os treinos decorrem de segunda a sexta, ao final da tarde. Aos fins de semana, os professores Sancho Moura e Luís Orelhas acompanham os atletas em torneios.

Na Coração Delta Academia de Ténis, o ténis é visto como mais do que um desporto. “A parte mental é fundamental. Estamos sempre a errar e a superar-nos, e é assim que vamos melhorando”, explica o treinador. O espírito de equipa e o ambiente familiar são marcas do clube. “Os treinos passam a correr, e no fim os miúdos perguntam: ‘já?’ – isso deixa-me muito feliz. Sinto que contribuímos para um momento de foco e de alegria na rotina destas crianças.”

Em 2025, decorrerá a primeira edição do Torneio de Ténis Comendador Rui Nabeiro, um evento federado que homenageia o padrinho do clube e os valores por ele sempre defendidos: superação, resiliência e civismo. No futuro, a academia pretende continuar a crescer e inspirar mais jovens a descobrirem o ténis como uma forma de estar na vida.

11. Campo Maior Vila Solidária da Europa

Campo Maior Vila Solidária da Europa é um programa que, desde 2013, apoia pessoas desempregadas, famílias vulneráveis, crianças e idosos. Trabalha com fundos europeus e atua localmente, através de contratos locais de desenvolvimento social. Como? Promovendo oportunidades e criando pontes entre trabalhadores e empresas locais, contribuindo para o desenvolvimento de competências sociais e cívicas, e fomentando a igualdade e a integração de pessoas vulneráveis na comunidade.

Maria Manuel Valentim, coordenadora do projeto, já perdeu a conta aos projetos que mais a marcaram neste período. Destaca, no entanto, o voluntariado jovem em instituições locais durante as férias escolares de verão, que se repete há 12 anos. “Chegámos a ter mais de 100 voluntários por ano”, diz, orgulhosa. “É uma forma de saírem de casa e de serem chamados a trabalhar a empatia, a responsabilidade e o sentido de comunidade. No final, têm um certificado de competências adquiridas.”

Entre as histórias inspiradoras está a de Xavier, um jovem apaixonado por informática que, com apenas 15 anos, foi voluntário na Comissão Unitária de Reformados Pensionistas e Idosos de Campo Maior, onde se dedicou a ensinar os idosos a usar redes sociais, e-mails e videochamadas, para contactarem com familiares que viviam longe. O impacto foi enorme: “No fim do estágio, os idosos perguntavam muito pelo Xavier. Adoraram-no. E ele também, porque percebeu a diferença que fez junto daquelas pessoas.”

12. Girl Move

Alexandra Machado tinha uma carreira consolidada no mundo corporativo, incluindo dez anos como diretora-geral da Nike Portugal, quando decidiu mudar de rumo. Em 2012, inspirada pelo impacto da Fundação Girl Effect, percebeu que queria dedicar a sua experiência à transformação social. Foi assim que nasceu a Girl Move Academy, associação que aposta na educação e liderança feminina como ferramentas para o desenvolvimento de Moçambique.

A Girl Move acredita que formar uma mulher é transformar uma comunidade. “A nossa missão é promover uma nova geração de mulheres que sejam agentes de desenvolvimento do país”, conclui Alexandra. Na academia, o modelo inovador de mentoria e aprendizagem intergeracional liga raparigas a mulheres que as possam inspirar em diferentes áreas, criando uma rede de impacto social. Desde a sua fundação, o projeto já mudou a vida de mais de 15 mil jovens, promovendo um efeito multiplicador que chega a famílias inteiras.

O projeto tem sido reconhecido internacionalmente e é apoiado por várias organizações, incluindo o Coração Delta. E algumas destas jovens têm estagiado nas empresas do Grupo Nabeiro. Prova de que a capacitação e empoderamento de mulheres consegue desafiar barreiras e criar oportunidades.

13. Pro-Move-Te

O três em um de palavras no nome reflete o espírito desta iniciativa: dinâmica, personalizada, rápida. O Pro-Move-Te é um programa de empregabilidade jovem criado em 2017, que conta com nove municípios do distrito de Portalegre e a Delta Cafés como parceiros. David Ferreira, de Campo Maior, participou na primeira edição e guarda ótimas memórias dos três meses de formação. “Tinha acabado de me mudar de Lisboa. Inscrevi-me porque queria perceber que empresas existiam na região e que tipos de vagas havia.” A experiência superou as expectativas.

Com um programa dinâmico, o Pro-Move-Te promove a troca de experiências e cria oportunidades para empresas e jovens desempregados. Como? Através de mentoria, coaching e formação sobre reformulação de currículos e melhoria da expressão oral – além de organizar visitas a empresas e promover contacto direto com recrutadores.

“Eu tinha 10 anos de experiência em serviços jurídicos e acabei por descobrir, através do Pro-Move-Te, uma vaga precisamente nessa área, na Delta.” David ficou com o trabalho, que manteve por seis anos, tendo depois transitado internamente para o departamento de sistemas de informação, onde está atualmente como técnico de help desk. “Olhando para trás, o Pro-Move-Te foi o meu ponto de viragem.”

14. 3D Printing Center for Health

A tecnologia ao serviço de quem mais precisa cria milagres. Exemplo disto é a 3D Printing Center for Health – associação fundada em 2022 por professores e investigadores dos centros de investigação LIBPhys e UNIDEMI, em colaboração com o FCT Fablab – que desenvolve dispositivos médicos através da impressão 3D com as características necessárias a cada caso, e os oferece, gratuitamente, a quem mais precisa. “Desenvolvemos dispositivos cada vez mais personalizados, para que as pessoas ganhem autonomia e qualidade de vida”, explica Cláudia Quaresma, presidente da associação.

Em menos de dois anos, a 3D Printing Center for Health já produziu 82 dispositivos para 79 doentes e nove serviços de saúde, incluindo modelos anatómicos que ajudam cirurgiões a preparar operações complexas. Entre muitas histórias marcantes, destaca-se a de uma menina que nasceu sem uma das mãos. Aos 8 anos, Carolina recebeu três próteses feitas exclusivamente para si: uma para atividades gerais, outra para a ajudar a comer e uma terceira para que pudesse andar de bicicleta. A primeira coisa que fez, ao experimentar a prótese de atividades gerais, foi formar um coração com as mãos.

“A equipa teve mesmo de se esforçar para não deixar cair uma lágrima. Percebeu-se que aquilo era muito simbólico para a Carolina e para os seus pais.”

Com mais de 60 voluntários e parcerias com hospitais públicos e privados, o 3D Printing Center for Health continua a crescer com o apoio do Coração Delta, respondendo a um número cada vez maior de pedidos e, no processo, mudando vidas com inovação e solidariedade.

15. Café que abre portas

Uma experiência imersiva no mundo do café, que combina conhecimento técnico, desenvolvimento pessoal e aproximação ao mercado de trabalho. Assim é o Coffee Training, uma iniciativa do Coração Delta destinada a estudantes e jovens à procura de emprego. O programa decorre no Centro de Ciência do Café, num dia dedicado à aprendizagem e ao networking. Dragos Cristian Florea, de 22 anos, técnico de manutenção industrial na Delta, participou no Coffee Training em 2020 enquanto frequentava uma pós-graduação em Metalomecânica e Metalurgia. “Fomos num grupo de 15 estudantes. Fizemos uma visita ao Centro de Ciência do Café, conhecemos toda a história do café e realizámos alguns exercícios interpessoais”, recorda. Para Cristian, a experiência foi excelente. “Aquele dia ajudou-nos a prepararmo-nos para o mercado de trabalho.” O contacto com o mundo do café revelou-se particularmente útil quando se tornou serralheiro na Delta. “Os conhecimentos que adquiri foram uma mais-valia, assim como os contactos que fiz”, afirma.

16. ESTAR

Sem burocracias nem meias respostas, a ESTAR compromete-se a marcar presença onde a sua ajuda é mais precisa. Fundada em 2019 por Madalena Palma e Inês Féria, a associação dá resposta imediata a emergências sociais, apoiando associações e populações em momentos críticos, como incêndios, cheias ou outro tipo de emergências. “Percebemos que a rapidez da resposta era inovadora e diferenciadora”, recorda Madalena Palma.

Durante a pandemia, o trabalho da ESTAR foi particularmente marcante. Muitas comunidades estrangeiras – com situações de trabalho precárias e em setores que congelaram de um dia para o outro – ficaram sem sustento e, por vezes, sem ter o que comer durante dias. “Valeu-nos a carrinha doada pelo Coração Delta”, garante Madalena. Tinha chegado no ano anterior e fez toda a diferença.

“Enchíamos a carrinha e distribuíamos alimentos por quem mais precisava. Sinto que chegámos no momento certo a muitas pessoas.”

Com um armazém de bens alimentares sempre pronto para responder a crises e uma rede de apoio crescente, que conta atualmente com 40 voluntários e sete funcionários, a ESTAR atua no distrito de Beja e colabora com outras associações de norte a sul do país.

17. CM Factory

Uma fábrica do futuro só podia estar ligada a jovens. O CM Factory é o programa do Coração Delta que desafia os campomaiorenses a tornarem-se agentes de mudança na sua própria vila. Através de palestras, workshops e mesas-redondas, promove–se o debate sobre empreendedorismo, inovação e fixação de talento nas regiões mais despovoadas.

Sara Henriques, campomaiorense e fisioterapeuta, participou numa das iniciativas enquanto membro do GEDA – Grupo de Ecologia e Desportos de Aventura, uma associação que dinamiza a vila com vários tipos de atividades (sendo a mais conhecida o Festival dos Grous).

“Foi interessante sentarmo-nos para conversar sobre Campo Maior e as possibilidades que a vila tem por explorar”, explica. Discutiu-se a descentralização, o que pode ser feito pela fixação dos jovens no interior do país e pela dinamização do território. “São temas que nos tocam bastante. Desse dia, ficou fundamentalmente a percepção de que não estamos sozinhos nisto.”

18. Missão Católica na Guiné-Bissau

A Missão Católica na Guiné-Bissau não é uma associação formal, antes um grupo organizado de voluntários que, desde 2021, tem levado apoio essencial a comunidades locais. João Mendes é o porta-voz deste grupo e um dos voluntários mais ativos. Duas vezes por ano vai para o terreno em missão, acompanhado de eletricistas, professores e médicos, garantindo que as necessidades mais urgentes serão atendidas.

O impacto já se sente em várias frentes. O grupo começou por criar um infantário para 80 bebés e, depois, uma escola primária para 57 crianças, onde uma das salas recebeu um nome simbólico: Sala Delta.

“É um esforço conjunto. Sem os mais de 80 voluntários e sem o apoio de entidades como o Coração Delta seria impossível”, garante. Somou-se ainda um segundo infantário para 97 crianças, na localidade de Suzana.

Foi precisamente nesse local, na fronteira norte da Guiné-Bissau com o Senegal, que decorreu a última missão, no final de 2024. Foram beneficiadas diretamente 830 pessoas, um recorde que deixou os voluntários muito satisfeitos. “Apenas com um donativo do Coração Delta de painéis solares e baterias, conseguimos iluminar a localidade de Suzana. Hoje, há energia na escola, no posto médico e na rádio local.” Os impactos são por vezes difíceis de quantificar, mas sentem-se. “A gratidão daquelas pessoas pelas coisas mais simples que possamos imaginar é enorme. Para mim, este projeto é um despertar”, afirma João Mendes.

19. Talento Empreendedor

Passar fins de semana em reuniões de pais não é propriamente um programa de sonho, reconheçamos. Mas “foi transformador”, garante Jorge Grifo, ao recordar a iniciativa promovida pelo projeto Casa Interior, do Coração Delta, em 2018. O desafio era debater, em conjunto com outros pais ligados ao Centro Educativo Alice Nabeiro, o talento nas crianças – como descobri-lo, estimulá-lo e potenciá-lo.

Foram três meses de sessões de grupo, que incluíam conversas e dinâmicas práticas. O que se aprendeu foi de tal forma útil que resultou num “manual feito com amor”, como o descreve Jorge. Talento Empreendedor: Dicas para pais e mães é um guia que pretende ajudar os pais a repensar a forma como acompanham o crescimento dos filhos e a valorizar os sinais que revelam os seus talentos. O livro sintetiza o que Jorge – e os outros participantes das sessões – descobriram sobre a paternidade e que tanto os inspirou.

“Eu tenho um rapaz de 14 anos e uma rapariga de 11. Aquele trabalho que desenvolvemos levou-me a pensar no nosso dia a dia e em como, mesmo no meio dos afazeres, é preciso encontrar tempo para conversar com calma e presença. É pelos pequenos indícios que percebemos como eles estão e quem eles são de verdade. Às vezes, dez minutos de conversa fazem toda a diferença. Essa foi a lição que mais me marcou em todo o projeto.”

20. Um novo coração…

Duas décadas depois, o coração de vidro oferecido a Rui Nabeiro voltou a protagonizar um momento cheio de significado. A 31 de janeiro de 2025, a associação celebrou 20 anos com uma cerimónia no Centro Educativo Alice Nabeiro, em Campo Maior. O evento reuniu várias personalidades, incluindo o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e a presidente do Coração Delta, Rita Nabeiro, num momento de reconhecimento do impacto social da associação ao longo das últimas duas décadas.

Um dos momentos mais simbólicos foi a entrega ao Presidente de uma réplica do coração de vidro que simbolizava o nascimento do Coração Delta, como forma de assinalar o compromisso contínuo da associação com a solidariedade social. Mas a surpresa não ficou por aí. Marcelo Rebelo de Sousa trazia também um gesto especial: a condecoração do Coração Delta como Membro Honorário da Ordem do Mérito, como forma de destacar o seu trabalho na inclusão social, educação, saúde e apoio à comunidade.