Dia 1: Arranque minhoto

O dia começa cedo porque se adivinha longo. Um dia não é suficiente para conhecer Viana do Castelo, mas permite ficar com uma ideia não apenas da cidade como da região. Comecemos no mar, com uma visita ao Navio-Escola Gil Eanes, enorme e imponente, atracado na antiga doca comercial. O percurso labiríntico no interior do navio-hospital dá a conhecer a sua história, desde a construção nos estaleiros de Viana do Castelo, às décadas em que prestou assistência aos pescadores da frota bacalhoeira, fazendo do visitante uma personagem daquela realidade, já que circula pelos diferentes espaços sozinho, ao seu próprio ritmo.

Sem largar terra firme, seguimos para o Museu do Traje, uma visita imperdível. São quatro pisos de centenas de trajes para admirar – cada um diferente do outro, consoante a freguesia de origem, a época, a ocasião em que é usado. A prova da “chieira” minhota – palavra regional que significa “orgulho” ou “vaidade” de ser do Minho.

De apetite aberto, segue-se um almoço de petiscos, num espaço descontraído e muito popular entre os locais. No Tabernão, as tapas portuguesas e espanholas misturam-se na ardósia que atravessa a parede de um lado ao outro da sala – afina, a Galiza é já ao lado. Não vale a pena pedir sugestões ao Carlos, apressado e carismático proprietário, que chuta para canto com um rápido “é tudo bom”. Não discordamos.

Já depois de uma rápida paragem para uma afamada bola de Berlim, subimos até ao Santuário de Santa Luzia. A subida é por si uma experiência – e há versões para todos os gostos. De carro, são cinco minutos; pelo escadório, são 659 sofridos mas bonitos degraus; de funicular, são seis minutos para alcançar 160 metros de altitude – e vale a pena pela vista. No alto, o Santuário do Sagrado Coração de Jesus é tudo o que se adivinhava: magnânimo e esmagador.

O dia termina na porta ao lado, a da Pousada Viana do Castelo – de onde a vista supera até a do Santuário, porque o inclui no postal.

Dia 2: Corações ao alto

Neste segundo dia o ritmo é outro, desde logo porque começa na Pousada Viana do Castelo, com um pequeno-almoço no terraço soalheiro. A construção do edifício remonta a 1903 e os diferentes espaços deste hotel de charme refletem a sua história centenária, da tapeçaria de Almada Negreiros aos salões requintados, convertidos em restaurante e bar.

Fazemo-nos à estrada já a manhã vai a meio, em direção a Vila Nova de Cerveira, mas antes de lá chegarmos temos duas paragens incontornáveis. A primeira é o Núcleo Interpretativo dos Moinhos da Gávea, em que se visitam os moinhos recuperados e se aprende sobre o ciclo do milho e as formas tradicionais de moagem (convém marcar visita e consultar com atenção os horários, que são pouco convencionais).

A poucos quilómetros dali fica o Miradouro do Cervo, escolhido a dedo entre os muitos miradouros que há na região, vários deles capazes de fazer saltar batimentos cardíacos. Se for apenas a um, escolha este – instalado sobre as ruínas arqueológicas do primeiro castelo das Terras de Cerveira, erigido no alto do Monte da Senhora da Encarnação para controlar toda a entrada do vale do Minho. Fica-nos, desses tempos, a vista sublime – acompanhada pela silhueta do cervo, a escultura em ferro que se avista da vila, a espreitar das alturas. 

Sempre a descer, chega-se a Vila Nova de Cerveira, vila pequena e charmosa. Passeie pelas ruas do centro histórico, suba ao castelo, entre na igreja matriz e não deixe de provar o doce cerveirense – uma bomba calórica que combina doce de gila, canela e amêndoa, envoltos em massa folhada. Seguindo em direção à zona ribeirinha, dá-se com o Parque de Lazer do Castelinho, perfeito para um final de tarde bem passado. Há campos desportivos, um grande parque infantil e até um tímido skate park. À sombra das árvores e nas mesas de madeira juntam-se cerveirenses a ler, a conversar e a fazer piqueniques. No rio Minho, vê-se um ou outro aventureiro a fazer canoagem, a praticar stand up paddle ou em passeios de barco com boias (as atividades estão disponíveis no parque, havendo condições favoráveis). A grande atração é, no entanto, o Aquamuseu do rio Minho. Numa visita rápida e dinâmica fica-se a conhecer os peixes que habitam o rio – que corre de Lugo (Espanha) a Caminha, onde desagua no Atlântico – em nove aquários e trava-se amizade com a estrela da companhia: uma lontra, de seu nome Miranda, que brinca todo o dia e faz sorrir quem a observa.

Pernoitamos em casa da avó – sim, da avó Quinhas, que inspirou o neto a abrir um bed & breakfast na antiga casa da matriarca da família. Acolhedor e simples, a Quinta da Quinhas está decorado de forma minimalista, mas com vários apontamentos minhotos. Há tiny houses que acolhem até três pessoas, quartos duplos e ainda uma camarata para 10 – a preferida dos peregrinos que aqui passam a caminho de Santiago de Compostela. A cozinha está aberta a todas as horas, com pão da aldeia e fruta da horta para quem se quiser servir.

Dia 3: Natureza pura

A poucos quilómetros da Quinta da Quinhas ficam alguns dos tesouros naturais mais surpreendentes da região. Falamos da Cascata do Pincho, também conhecida como Cascata da Ferida Má. O lugar, abraçado pela Serra D’Arga, é idílico e surpreendentemente extenso, com várias quedas de água e piscinas naturais. Para lá chegar, não faça como nós: quando se aproximar do local, ignore o GPS e siga antes pelas indicações (certeiras) deixadas pelos locais. 

Bem perto e dentro do mesmo estilo, temos a Lagoa da Esturranha. A água azul-turquesa faz-nos esquecer que estamos a meros 200 metros da Estrada Nacional 305, pois o ambiente ali é de calmaria e total comunhão com a natureza.

Para procurar almoçar vamos até à marginal de Vila Praia de Âncora, onde o peixe e marisco é do mais fresco que há. No caminho, é de passar pela Escadaria do Calvário: doze lanços de escadas, cada um de onze degraus, com uma cruz em cada patamar em homenagem aos diferentes momentos da Via Sacra. O que vale é que a descer todos os santos ajudam.

De estômago cheio, vamos desmoer o almoço num passeio a pé ou de bicicleta pela Ecopista do Minho acima, que liga Caminha a Vila Nova de Cerveira sempre junto ao mar. A meio do caminho paramos estrategicamente numas das mais bonitas praias da região, a Foz do Minho e Camarido. Dali exploramos também a Mata Nacional do Camarido, mandada plantar por D. Dinis e hoje composta por mais de 120 hectares de floresta. 

Para regressar a Viana, apanhamos o comboio – um lugar à janela do lado direito garante a melhor vista. O roteiro termina com chave de ouro: no restaurante O Camelo, em Santa Marta de Portuzelo. Ali se provam sabores minhotos autênticos – do cabrito ao arroz de galo, sem esquecer os best-sellers: arroz de sarrabulho e rojões à moda do Minho. Três dias depois, fica a certeza: no Alto Minho, o tempo abranda, a natureza impõe-se e há sempre algo mais por descobrir.