Miguel Neiva Correia, 39 anos

Agricultor

Aos 33 anos, Miguel saltou da cozinha para a horta e encontrou na natureza um negócio verde, rentável e uma vida bem mais aprazível.

Prepara, salteia, frita, coze, reduz, assa, mexe, tempera, emprata, recomeça. O dia a dia de Miguel Neiva Correia foi passado nesta dança frenética durante os mais de dez anos em que foi cozinheiro. Trabalhou com “grandes tubarões da cozinha”, como lhes chama, e o sucesso profissional deixava-o satisfeito, mas, com o passar do tempo, tornou-se tudo o que tinha na vida. “Antes de me tornar cozinheiro era uma pessoa muito sociável, tinha imensos amigos e gostava de sair”, conta Miguel. “Mas aos cozinheiros só é permitido socializar com os seus pares, porque os nossos horários são ao contrário dos das outras pessoas, não te cruzas sequer com a família. Além de que somos formatados para sermos práticos, disciplinados, exigentes, brutos. Eu passei a ser assim.” A rotina sôfrega fez com que, aos 33 anos, tivesse um burn out. Foi nesse momento que decidiu parar.

Tendo uma forte ligação ao campo e vivendo numa casa de família com terrenos, na zona de Torres Vedras, foi lá que Miguel se refugiou – e foi ali que acabou por encontrar um novo rumo. Começou por se dedicar à horta para alimentar as necessidades lá de casa, mas, aos poucos, a produção começou a exceder essas necessidades e rapidamente o hobby passou a negócio. “As pessoas à minha volta foram-me incentivando e pedindo para assumir isto mais a sério.” E assim nasceu, em meados de 2016, o Hortelão do Oeste.

A empresa vende produtos hortícolas para restauração, hotelaria e clientes particulares, oferecendo uma série de variedades raras e difíceis de encontrar no mercado tradicional. “O Hortelão do Oeste surgiu de uma teimosia minha. Depois de deixar a cozinha, quis fazer esta ligação entre a horta e a restauração. Tendo sido cozinheiro, sabia o que os cozinheiros procuravam e sentia que havia pouca variedade de ingredientes. Achei que podia ajudar nesse sentido e, portanto, o meu objetivo foi desconstruir a indústria, torná-la menos padronizada e trazer de volta variedades de produtos hortícolas esquecidos.”

Em 2017, a empresa cresceu dez vezes e, em 2018, mais dez vezes em relação ao ano anterior. Os 500 metros quadrados com que começou deram lugar a mais de três hectares dedicados exclusivamente à produção de hortícolas frescos. E se Miguel começou por trabalhar quase sozinho neste projeto, hoje as coisas mudaram de figura: conta com a ajuda de sete funcionários para o trabalho de campo necessário, que nunca falta, e ainda com outras duas pessoas para a administração da empresa. Pese o crescimento da empresa, este é, desde o início, um projecto familiar, que arrancou com o seu pai. E haveria melhor forma de trabalhar com comida do que em família? “Tanto a cozinha como a horta vão dar à mesa. E, em minha casa, na minha família, é à mesa que nos encontramos, é à mesa que todos os problemas se resolvem, que se passa a página de cada dia. É um ponto de viragem.”

Nesta segunda vida que Miguel escolheu, há menos calma do que esperava. “Mudei de rumo para encontrar descanso e agora, pronto… Mas já percebi que isto é feitio. Eu não gosto de coisas fáceis, gosto mesmo é de desafios.” Pelo meio, há mais tempo, mais natureza e mais equilíbrio. “A quantidade de trabalho não mudou, mas mudou o timing do stress. Mudou também o teto do meu escritório, que em vez de ser com tubos em aço, é essencialmente azul. Isso dá-me muito prazer: trabalhar ao ar livre e com as mãos na terra, a dar vida às coisas. É um privilégio.”

Tiago Pereira, 48 anos

Realizador

Escutar um homem que trauteava as canções que ouvia mudou a vida do criador de “A Música Portuguesa a Gostar Dela Própria”.

Na primeira casa que se vê à entrada de Serpins vive alguém que veio de longe. Tiago Pereira, alfacinha de gema, decidiu, aos 47 anos, mudar-se para uma pequena vila no distrito de Coimbra. E garante que não foi uma decisão demorada ou difícil de tomar: “Era o que fazia sentido.”

O seu percurso foi aos ziguezagues. Começou cursos que não acabou, escolheu áreas que não eram as suas, até perceber “que a escola não era feita para todos”. Foi em 1998 que Tiago descobriu a sua vocação, ou melhor, que a ouviu. “Com 25 anos, fui a Odeceixe e conheci um homem que trauteava músicas”, conta. 

Da mesma forma que os irlandeses trauteiam os sons dos instrumentos através de uma técnica a que chamam lilting, este alentejano em que Tiago tropeçou trauteava os sons do acordeão que ouvia nos bailes. Tiago eternizou-os com o seu gravador. “Ele explicou-me que se ia a uma festa e ouvia uma melodia, no dia seguinte já a estava a cantar no mesmo tom. Foi incrível ouvi-lo. Aquele homem marcou um momento decisivo na minha vida, olhando para trás. Tudo mudou a partir dali.”

Tiago despertou ao som do que escutara, mas sentiu que àquele som do gravador faltava alguma coisa. Mais tarde, ao trautear do alentejano juntaram-se imagens que contavam uma história diferente. As duas, sobrepostas, ganhavam dimensão. “Eram duas coisas muito distintas, mas faziam sentido juntas, contavam uma história nova. Aquilo mudou tudo para mim. Fez-me perceber que alterando a perspetiva se altera o todo.”

Sendo filho de Júlio Pereira, um dos grandes mestres da música portuguesa do século XX, Tiago passou a infância rodeado de grandes músicos. Desses tempos, ficou-lhe o gosto musical, mas, essencialmente, o fascínio pelo lado humano da música. Nos anos que sucederam a sua descoberta em Odeceixe, o realizador andou pelo país a ouvir e a debruçar-se sobre tradições orais, levando-as para novos projetos e, muitas vezes, até às escolas. As surpresas agradáveis foram tantas que decidiu avançar com um projeto que o tornou, nas suas palavras, “uma espécie de Robin dos Bosques da música”. “Não é roubar aos ricos para dar aos pobres, mas é dar voz a quem não a costuma ter. Nós estamos habituados a ouvir aquilo que nos dão na rádio, mas há muitas outras coisas boas que poderíamos conhecer.” 

A Música Portuguesa a Gostar Dela Própria surgiu então em 2011 com o objetivo de recolher, gravar e divulgar canções, romances, paisagens sonoras, contos, música, dança e gastronomia, e é hoje difundida na televisão (RTP Memória), na rádio (Antena 1 e Antena 2) e nas redes sociais. Com presença de norte a sul do país, esta associação conta atualmente com um dos maiores arquivos audiovisuais de tradição oral e memória coletiva em Portugal. “O intuito é dar voz a estas pessoas que, muitas vezes, nem reconhecem valor naquilo que fazem, acham que não é nada de especial. É o que lhes dizem, é o que ouvem da sociedade”, explica Tiago. “Estamos todos tão formatados para caber em caixas que nem sabemos o valor que temos.”

Depois de duas décadas a correr o país e a viver cada vez menos a cidade, a mudança para o meio rural era apenas natural. Deu-se em março de 2020 e não deixou remorsos. “O som que me acompanha é apenas o do rio Ceifa. À noite, o silêncio é tão profundo que tive de me habituar a ele, lentamente. Depois de anos a visitar vilas como esta, faz todo o sentido viver aqui.”

Margarida Adónis, 54 anos

Produtora e empresária 

Um café demorado com uma amiga deu um novo rumo à vida frenética de Margarida, que até já promete que há de aprender a tecer.

O ritmo em Lisboa sempre foi frenético. Tanto Margarida Adónis como o marido, Renato, trabalhavam em produção de publicidade, “uma área em que simplesmente não há horários”. Enquanto eram só dois, o tempo parecia chegar para tudo, incluindo a vida social e cultural que a cidade oferecia. Mas à medida que a família foi crescendo, a necessidade de parar e aproveitar cada momento tornou-se evidente. 

“Olhando para trás, este processo de mudança começou há três anos, quando percebemos que os nossos filhos, na altura com três e oito anos, estavam a ser educados pela nossa empregada”, recorda. “Foi nessa altura que o Renato deixou o trabalho e passou a ser pai a tempo inteiro, assim daqueles que levam os miúdos à escola de bicicleta todos os dias. E eu fiquei com uma certa inveja.” 

Nos dois anos seguintes, Margarida continuou a trabalhar mais do que a viver, suspirando pelo tempo em família que não tinha. Feitas as contas, o custo estava a ser demasiado alto para a qualidade de vida que tinham. No verão de 2019, avançaram com a mudança mais radical que puderam conceber e mudaram-se do Campo Pequeno, no centro de Lisboa, para o para “o verdadeiro campo grande” – aquela que era até aí a sua casa de férias, a 21 quilómetros de Reguengos de Monsaraz.

“Para os miúdos foi mais suave: mudaram do quarto deles para o quarto deles, porque esta já era de alguma forma a nossa casa. Para nós, foi uma adaptação mais longa, principalmente por aqui estarmos longe de toda a gente. Conhecíamos o pastor e a senhora da leitaria, mas não tínhamos amigos.” 

A amiga mais próxima estava em Reguengos de Monsaraz: Mizette Nielsen. Era por isso que, quando ia à cidade, Margarida visitava sempre a holandesa, figura bem conhecida dos reguenguenses desde que, em 1976, adquirira a Fábrica Alentejana de Lanifícios para juntar teares e tecedeiras com o objetivo de não deixar morrer a tradicional manta alentejana. Margarida, que sempre foi fascinada pelo universo têxtil e pela mistura de cores, fazia questão de beber um café com Mizette todas as semanas.

Foi numa dessas visitas, durante um café mais demorado, que Margarida soube que a senhora Nielsen tinha a intenção de vender a fábrica; “não a alguém que fosse fazer dela uma pizzaria”, como já lhe haviam proposto, mas a quem compreendesse o projeto e lhe desse continuidade. As palavras ecoaram em Margarida. Longe de ter o montante necessário, a produtora desafiou outros dois amigos, António Carreteiro e Luís Peixe, a embarcarem com ela nesta aventura. E daquele café nasceu, em janeiro de 2020, a Fabricaal.

A marca surgiu no princípio de um ano que havia de ser particularmente difícil, mas que, ainda assim, foi de crescimento. O trabalho na produtora teve de abrandar para que Margarida pudesse cuidar deste novo e exigente projeto. E apesar de os teares centenários continuarem a ser manejados pelas tecedeiras que trabalhavam com Mizette, Margarida garante que, em 2021, há de sentar-se durante três ou quatro meses num tear para aprender. “Não quero não saber. Não quero ser uma business woman. Não quero ser dona desta fábrica para gerir um negócio, quero ser dona desta fábrica para trabalhar aqui e saber como é que estes tapetes e estas mantas se fazem. É mergulhar mesmo, não é pôr só o pezinho.”

Pare, escute, beba

French Press

É difícil determinar com certeza a origem da prensa francesa, mas consta que foi no ano de 1852 que os franceses Mayer e Delforge a patentearam, numa versão diferente da que conhecemos hoje, com o êmbolo dentro do recipiente. O equipamento ganhou popularidade depois de o suíço Faliero Bondanini, em 1958, ter patenteado uma versão mais moderna da mesma prensa, a que hoje utilizamos. Depois de este produto conquistar o mercado britânico, a conhecida empresa dinamarquesa Bodum comprou os seus direitos e passou a ser a grande marca associada a este sistema de extração. A prensa (ou cafeteira) francesa é, então, um método de infusão por excelência, que deixa o café repousar antes de o misturar uniformemente na água e que o filtra através da sua passagem por uma malha metálica larga, que permite um sabor mais forte e apurado.

O melhor blend para uma pressing experience com este equipamento é o “Costa Rica & Tanzânia”, com aromas florais e notas de citrinos e frutos vermelhos.

AeroPress

Este equipamento foi criado em 2005 pelo inventor norte-americano Alan Adler e é um dos métodos de extração mais conhecidos atualmente. Funciona com dois cilindros que encaixam um no outro, um maior e outro menor. Através  desta técnica, o café repousa em infusão na água quente (é mergulhado durante alguns minutos) e depois é passado através de uma rede, sendo o êmbolo pressionado ao longo do recipiente. A solução é então filtrada através de uma pressão em vácuo, dando-lhe uma composição intensa e aromática. O tempo da infusão depende da moagem do próprio café e do resultado pretendido — quer em termos de sabor, quer em termos de textura.

A pressing experience com AeroPress ganha com o blend também utilizado para a French Press, “Costa Rica & Tanzânia”, que garante uma textura rica, de sabor doce e aromas florais, com notas de frutos vermelhos e cítricos.

V60

Este sistema de extração funciona com filtro, pelo que integra a dripping experience do Slow Coffee. Chama-se“V60” porque o porta-filtro tem um ângulo de 60 graus. Porque o filtro é colocado sobre uma superfície ligeiramente irregular, o café moído expande durante a filtragem. A forma cónica do filtro permite-lhe filtrar de forma homogénea, forçando o fluxo de água para o centro e extraindo assim as melhores propriedades do café. O orifício de saída da bebida é maior do que o habitual, o que lhe confere melhor sabor pela velocidade controlada da passagem da água. A qualidade do próprio filtro garante ainda que o sabor final é o mais puro possível. 

Para a V60, o café mais indicado é o do blend “Costa Rica, Índia, Tanzânia & Timor”. Com um ligeiro toque de especiarias indianas e notas de avelã e amêndoa torrada da Tanzânia, representa uma viagem sensorial por estes continentes.

Balão

O método de preparação de café a vácuo na cafeteira de balão surgiu na Alemanha durante o século XIX. A cafeteira funciona segundo o princípio de expansão e concentração dos vapores de água, pelo que utilizá-la é entrar numa experiência muito sensorial que faz lembrar um laboratório em ação. A preparação do café neste equipamento permite, também, um ritual de partilha, uma vez que o balão proporciona doses maiores da bebida. E porque as melhores coisas da vida são as que partilhamos com aqueles de quem gostamos, o balão é o equipamento ideal para encontros de família ou amigos, numa pressing experience deliciosa e saboreada ao ralenti.

“Colômbia, Etiópia, Guatemala & Uganda” é o blend de café certo para usar com este balão, já que é encorpado e achocolatado, com notas de castanhas, florais e tropicais da Colômbia.

Chemex

É um sistema de extração antigo que permite obter os sabores e os aromas mais claros do café. A cafeteira Chemex é um recipiente de peça única em forma de ampulheta, feito de vidro resistente ao calor e de alta qualidade. Foi criada em 1941 por Peter Schlumbohm, um inventor alemão que ficou para sempre conhecido como o “Chemex Coffeemaker” (o fazedor de café Chemex). A invenção — que mais tarde foi apelidada de “uma síntese de lógica e de loucura” — foi sobrevivendo ao longo das décadas e é hoje, nesta versão atual, um ícone de design internacional, estando inclusivamente exposta no Museum of Modern Art (MoMA) em Nova Iorque.

No caso da Chemex do Slow Coffee, concebida para uma dripping experience, recomenda-se a utilização do blend “Colômbia & Etiópia”, que mistura notas de cacau, caramelo e acidez vibrante com o aroma floral da Etiópia, com notas de fruta, cacau e cereal.