Pedralva

Um pouco antes de chegar a Pedralva, vê-se um conjunto de casas branco e luminoso. É aqui que fica a Aldeia da Pedralva, um projeto de hotelaria que permite o alojamento de turistas nas antigas casas da aldeia. Em 2006, das centenas que outrora viviam aqui, restavam nove habitantes e várias ruínas. A recuperação manteve a arquitetura rural: paredes grossas dão frescura às casas e os pequenos adros ganharam grelhas e mesas para refeições.

Antes desta nova vida da Pedralva, o Pizza Pazza era o seu único negócio. O restaurante de pizzas do italiano Marco Moiola criou fama à conta da comunidade de alemães da Costa Vicentina e de caravanistas espanhóis. Não perdeu o ambiente hippie e, com música noite dentro, as pizzas são uma pequena parte da patine do lugar.

Faz parte da vida calma de aldeia beber um copo neste restaurante ao fim da rua, andar pelas hortas ou comprar ovos caseiros a um dos vizinhos, mas quem sai deste microcosmo arrisca outro tipo de paraíso.

Uma praia quase secreta é, no Algarve, uma preciosidade e por isso afirmamos que o acesso difícil (mas seguro) da Praia da Murração é a sua maior qualidade. Está a sul da praia do Amado e é complicado encontrá-la nos gps (em alguns, é útil arranhar o polaco e pesquisar por plaża Murração). Se entrar por uma estrada cheia de valas e a serpentear pela serra, está no caminho errado. A via certa segue por uma paisagem de turbinas eólicas e vai dar a um pequeno areal conhecido por surfistas, pescadores e grutas junto à rebentação: chegou ao seu destino.

Sagres

O Cabo de São Vicente é altar de peregrinação para quem gosta de um bom pôr do sol. A área do antigo Convento de São Vicente do Cabo, onde está o Farol e o seu pequeno núcleo museológico, é aberta ao público, mas a maior parte dos amigos e namorados fica à beira da estrada, na falésia, vira-se para oeste com copos de vinho na mão e assiste ao espetáculo.

O mesmo podiam fazer na Ponta de Sagres, com a vantagem de uma vista de oceano de este a oeste, na Fortaleza de Sagres. Esta estrutura militar do século xv aproveita o desenho natural do promontório de Sagres e recebe-nos com uma enigmática rosa dos ventos de 48 fiadas e 50 metros de diâmetro, só desenterrada em 1919. Esta ponta do continente é o monumento de eleição para pescadores de domingo e para longas caminhadas nos campos de lapiás.

Se este é local obrigatório para turistas, na rua do Mercado só se ouve falar português. Aqui seca-se moreia, no primeiro andar do Bica. Este restaurante de petiscos serve-a frita no ponto, crocante para comer em sandes ou com um esguicho de limão. Menos tradicionais são os pratos do Fermento, acabado de inaugurar por quatro amigos italianos. Com uma boa garrafeira de vinhos portugueses, o menu tem língua com molho verde ou tortellini de alfarroba.

Na estrada nacional, o Picnic também desafia a ideia do que é um café de beira de estrada. Além de servirem bagels, são loja de revistas, de vinhos naturais e de cervejas artesanais. Piscam o olho à bomba de gasolina em frente e, em vez de um painel com o preço por litro, têm um com o horário de funcionamento: as horas do nascer e do pôr do sol.

Vila do Bispo

O mais impressionante da paisagem de Vila do Bispo não é visível sem a dose certa de investigação. Por aqui há cerca de 250 menires. Alguns deitados, escondidos na vegetação, fazem da região um polo importante da Europa megalítica. O ex-líbris da rota megalítica de Vila do Bispo é o menir Padrão, erguido na estrada a caminho de outros dois monumentos incontornáveis: as praias do Zavial e da Ingrina.

Não é absurdo juntar praia e achados pré-históricos no mesmo passeio. Para total coerência histórica junte-lhes, aliás, um prato de percebes. Este marisco perigoso de apanhar está na dieta da região há 6500 anos: foram encontrados vestígios seus no conjunto arqueológico do Monte dos Amantes.

O símbolo de Vila do Bispo serve-se em vários restaurantes, mas pelo menos dois fazem a sua fama da ausência propositada do percebe. A Tascado Careca é conhecida pelas lulas recheadas, que só vêm à mesa quando estão no tamanho ideal – nem grandes, nem pequenas. Na falta, há lulinhas fritas. A outra casa é para amantes do reino vegetal. O Pisco centra-se em pratos sazonais e homenageia os produtores da terra – veja-se o baba negro de megronho, um bolo preto numa vénia às abelhas negras da zona.

De volta à estrada, em direção à Raposeira, é impossível não notar o casarão forrado a olaria. Está claro: a Cerâmica Paraíso vende loiças, em alguns casos, a preço de fábrica. Entre bibelôs para turistas, encontram-se pérolas. Mas primeiro é preciso que o cliente não se perca na admiração dos pratos e travessas pregados à fachada e consiga entrar.

Burgau

Começar o dia num supermercado será tão pouco ortodoxo como sugerir que se comece o dia num supermercado. Mas quando estão em causa as torradas mais gulosas do Burgau, corremos o risco. O Café do Burgau fica à entrada do minimercado Mais Perto e recheia-se de pão de massa mãe, bolos caseiros para todos os gostos, com e sem coberturas, o ubíquo pão de banana e pastéis de nata – tudo feito diariamente por Helena Silva e Kacper Lustyc, sogra e genro.

Abrem-se as portas automáticas do minimercado e vê-se a vitrina provocadora – Burgau faz-se destes casamentos inesperados. As veredas são apertadas, de recantos pitorescos, a pique até à praia. Na mesma rua, de um lado, há restaurantes com pratos do mundo, como o Miam, que serve foie gras ou tártaro de salmão; do outro, o estacionamento de barcos de pesca antigos. Num beco, uma fonte forrada a azulejos é prateleira de livros que qualquer um pode levar, se deixar outro.

Tudo isto está bem embrulhado. Visto de longe, Burgau é uma coleção de casinhas brancas à beira-mar. Vê-se bem do trilho que o liga a Almádena, cinco quilómetros pela costa, parte do percurso Salema-luz. Como estrela guia da caminhada estará sempre o Forte de Almádena em ruínas, equilibrado na ponta da falésia. À chegada, há recantos da construção do século xvii para explorar e pode descer-se a pé até à praia da Boca do Rio. Muito pequena, tem também o seu próprio edifício em ruínas. Sem telhado nem portas, dentro deste velho armazém brotaram figueiras frondosas que dão àqueles escombros cheiro de pomar. Outra vez, o inesperado.